quarta-feira, 11 de março de 2009

O som da chuva

Sempre morei em cidades grandes, e mesmo que fosse em bairros tranquilos, havia toda sorte de sons diários e característicos: buzinas, carros passando na rua, uma sirene lá longe, um avião no céu. Vez ou outra um passarinho.
Aqui, tudo é muito diferente, ou melhor, os sons são diferentes. Todas as manhãs acordo com uma sinfonia de papagaios avisando que "tá na hora de acordar". Quando algum morador passa pro andar de cima, o carro de som circula com uma música fúnebre avisando o passamento e informando local e hora do velório e sepultamento.
Chego ao sítio pouco depois das 7 da manhã todos os dias, e pelo caminho vou cruzando com muuuitos cachorros de rua. Cachorros de interior pois nem se preocupam em correr atrás do carro. Aliás, tem um cachorrinho que já deve ter morado em cidade grande, pois insiste em sair correndo de sua casa e me assustar com seu latido. INSISTIA. Depois que descobri onde ele mora, passei a frear rápido quando chego em frente à sua casa, frustrando o danadinho. É, eu também tenho um lado sacana. No sítio, alguns sons são constantes como o mugido das vacas das fazendas vizinhas, ou o som agradável de um pássaro chamado por aqui de Curicaca.
Mas nenhum som é mais fantástico do que o som da chuva chegando. Nas cidades grandes o céu escurece e a chuva cai. Em Bela Vista isso também acontece. Mas no sítio, a apenas 5 km do centro da cidade, pode-se ouvir a chuva chegar. Vou explicar: eu estava fazendo as amarrações no maracujal (assunto pra outro post) quando percebi que o tempo estava mudando. O rapaz que trabalha pra mim disse: "- A chuva vai chegar logo, olha o barulho." Agucei meus ouvidos, me concentrei, e consegui ouvir a chuva chegando. Sem raios, sem trovões. O barulho da chuva caindo na terra das fazendas, nas árvores. Chegando. A cada metro que aquela cortina cinza se aproximava, aquele som aumentava. Como se alguém estivesse aumentando o volume bem devagarinho. Como naqueles filmes que têm uma cena onde um som começa baixinho e vai aumentando à medida que algo se aproxima, e termina retumbante. Quando a chuva chegou, abrigados no galpão, eu quase não podia ouvir o que o rapaz falava.
E me emocionei. Jamais imaginei que um dia pudesse ouvir um som tão diferente. E tão bonito.
A cada dia que passo aqui, aprendo algo sobre a terra, as formigas, os cupins, como saber se vai chover olhando a lua. Nada até agora foi mais bonito do que aprender a ouvir o som da chuva que ainda não chegou. E estou aprendendo ainda mais a respeitar a natureza.

CARPE DIEM

6 comentários:

Laura Reis disse...

delícia

Rosana Tibúrcio disse...

Que lindo!!

Rosana Tibúrcio disse...

Agora, adorei o lado sacana com o cachorro...rs

Rosana Tibúrcio disse...

Helô, faça mais textos nesse estilo,porque esse ficou lindo. Quase pude 'olhar'sua chuva chegando.

Anônimo disse...

tadinho do cachorro, mã!!! Você deve ser a única diversão dele no dia!!!!

Verônica Cobas disse...

Uau...que delícia o teu relato. E doce, sensível, emocionante. Me senti aqui, em plena cidade do Rio de Janeiro, tentando aguçar os ouvidos para ouvir o som da chuva. Até senti o cheiro. Adoro demais textos que aguçam os meus sentidos. Que me fazem ouvir, sentir cheiro, quase tocar.
E você ainda falou dos vira-latas, minha grande paixão. Dificil não ter vontade de conhecer. Dificl aguardar para ouvir você falar do maracujal. Me fez bem te ler nessa sexta-feira.
Agora também te aguardo lá no Criative-se ( www.criativesse.blogspot.com). Hoje postei minha nova crônica e falei de viagens e paixões, não necessariamente nessa ordem e nem em seu formato mais tradicional. Queria muito ouvir seu comentário sensível. bjs. Veronica