quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Meu pai

Meu pai era um homem especial. Lindo de morrer, olhos verdes, bem galã de cinema. Fazia de tudo pela família. Pra ele, tudo poderia faltar, menos bons médicos e melhores escolas. E nunca nos faltou nada. Honesto e trabalhador foi, por muitos anos, um boêmio de carteirinha. Conheceu e foi amigo de muitos cantores e músicos da noite, numa época em que estes não tinham valor algum. Daí vem meu gosto por uma reunião onde haja um violão e onde eu possa cantar "sem medo de ser feliz".
Tinha o costume de apresentar as filhas por números. Ele dizia: " Esta é minha filha nº2. Esta é a nº4." Outras vezes dizia que tinha em casa 4 notas promissórias e um cheque ao portador, referindo-se ao meu irmão.
Em sua empresa de transportes, ele colocou o nome de cada filha em cada uma das carretas que possuía. Quando precisava de uma delas se comunicava com a garagem e soltava: "Sobe a Heloisa Helena. Dentro de 20 minutos pode subir a Vera Lúcia". Quando fui trabalhar com ele na empresa me acostumei com isso e percebi que houve muito carinho da parte dele em nomear suas carretas com nossos nomes.
Minha relação com ele nem sempre foi fácil. Por causa da maneira como foi criado, ele tinha muita dificuldade de externar seus sentimentos. Mudou muito depois que as netas nasceram. Muitas vezes, quando eu o via acarinhando ou beijando as netas, principalmente minha filha mais velha, eu sentia um misto de raiva, inveja e mágoa, por quase nunca ter recebido essas demonstrações de carinho. Ele se desdobrava pra ajudar as filhas mesmo depois de casadas, e sei que eu fui a que mais ajuda recebeu. E fui a única que saiu de perto da família. Foi muito triste pra ele quando levei pra longe sua neta mais querida. Naquela época eu não conseguia dimensionar a sensação de abandono que a distância provoca. Em alguns momentos a saudade pode dilacerar um coração. Hoje, tenho plena consciência que meu pai sentia muito amor por todas nós. Quisera eu voltar no tempo, mas com a vivência e maturidade de meus 53 anos, e dizer a ele tudo o que me vai n'alma. Isso, com certeza, me faria uma mulher mais feliz.

CARPE DIEM

9 comentários:

Jorge, FLÁVIA disse...

nossa Helô, nesse sentido temos histórias bem parecidas, de ter um pai tao especial, principalmente quando vc fala q podia faltar tudo, menos boa educação e bons médicos, o Sr. Gasparin é desse jeitinho e como bom tê-lo por perto ainda viu...
nossa, gostei demais e me fez refletir em mtas coisas sobre isso de 'pai e filha'...
boa tarde, mocinha...
bjo.

Anônimo disse...

Helô, você me fez encher os olhos d'agua.
Eu sou muito nova e tenho muito a aprender nesta vida, ô se tenho! E justamente pra viver mais e aprender mais eu acabo sempre tendo algum projeto (to estudando muito e me dedicando demais ao meus novos cursos, como nunca fiz!).
Estava certa de que iria me mudar de Borda este ano, mudar com a família, meter a cara na vida, estas coisas que a gente tem que fazer quando a palavra "adulto" bate na porta. Muitos falaram pra repensar, pq sair daqui implica em tirar a Luíza de perto do meu pai, que já está com 73 anos e é apaixonado por ela.
O seu texto foi o único que conseguiu isso, me fez pensar e talvez adiar estes planos por um tempo.

Grande beijo Helô!

Carla P.S. disse...

Se ele faleceu, continua vivo, e mais liberto do que nunca, visto que é espírito. Fala, fala tudo o que tu tens pra dizer com tua vivência, em orações. Ele escuta, ele sorri, o coração fica acalentado.
Um café.
Beijos.

Rosana Tibúrcio disse...

Adorei seu texto, de todos o que eu mais gostei. Porque fala de uma saudade e vontade de "se" sem ser piegas ou dramático: real apenas.
Adorei isso das carretas terem nomes das filhas... E ficou engraçado esse: sobe a Vera Lúcia (ai, será esse mesmo o nome de uma de suas irmãs?)
Adorei também a história das notas promissórias.
Seu pai era sábio, espirituoso... e não te beijava ou acarinhava mais... porque, porque... porque não sabia, Helô. Aprendeu com a neta: mais sábio ele ficou.
A-DO-REI!
Parabéns.

Quem sou eu pra dar conselho, quem sou eu, mas sinta-se mais feliz só por dizer do que faltou com tanto.
beijossssssss

Rosana Tibúrcio disse...

Meu comentário para o seu texto foi quase um post... hehe

Rosana Tibúrcio disse...

Ah, e isso do tal conselho que eu pretendia dar era esse: relaxa, tá tudo bem...

verena disse...

Mami!! Fiquei com saudades do vovô. E você não precisa dizer coisas para ele para ser mais feliz, sabe que a esta altura ele já sabe de tudo, né?

Anônimo disse...

Se o post já tinha deixado meus olhos marejados de lágrimas, o comentário-post da Rosana me fez derramá-las.
Beijos!

TRANQUILO E INQUIETO disse...

Pai eh pai. Milhoes de emocoes, milhoes de recordacoes...
Carinhos que entendiamos, broncas q nem tanto...
+ sempre tudo feito com o maior amor, maior dedicacao, maior atencao e todo cuidadao pra nao errar.
Avo eh avo. Eh outra coisa.
Outra msm... Eh mara.
100 obrigacao, 100 lenco e docmento. Nenhuma responsabilidade, por isso esse jeito tao mais solto...